sexta-feira, 4 de março de 2011

Modernoso

Certa vaidade em pessoa veio contar-me que numa das viagens financiadas pela empresa em que trabalha a um antigo país europeu desenvolvido – especificamente a uma empresa de negócios correlatos -, pôde constatar o atraso daquele exportador de cultura e disseminador das melhores práticas de gestão; sua obsolescência, pelo simples fato de que utilizavam uma planilha eletrônica, ao passo que ele, aqui, usava um sofisticadíssimo software desenvolvido pelo capital intelectual nativo.
Esqueceu-se dos salários que aquela empresa “arcaica” paga, a renda per capita dos habitantes, os indicadores sociais de altíssimo nível, reveladores da melhor qualidade de vida possível no capitalismo. Não atinou sequer que a empresa excursionada era líder no planeta na área de atuação da sua versão sul-americana, e inclusive, apresentava melhores e menos duvidosos resultados nas planilhas eletrônicas, do que ele no seu programa de ponta.
Com igual pasmo, à noite, tentei encadear a sequência de reportagens dos canais abertos: a) mais da metade de nossos irmãos estão ambientados na rede mundial e/ou tele-conversando por celulares; b) nas zonas centrais os punguistas preferem as bolsas das mulheres e os celulares de quem der sopa; c) mais de um quarto do povo está no limite da miséria; d) apresentamos relativos êxitos de crescimentos anuais; e) falta-nos mão de obra especializada; f) temos dos mais modernos códigos de trânsito do planeta e ainda assim muitos jovens se matam em acidentes ou são flagrados em franco desacato às leis; g) e demais reportagens: muitos assassinatos acontecem a todo instante pelos motivos mais fúteis ou torpes – estamos entre os primeiros lugares no ranking mundial de homicídios.
Fui dormir com sensação de que algo está desencaixado. Serei eu? Talvez também eu esteja deslocado nessa ordem.
Dia seguinte, no banco, a fila do caixa eletrônico não andava porque muitos usuários não sabiam operar a máquina e nenhum funcionário se dignava a orientá-los, até que, cedendo aos rogos e princípios de confusão, um empregado do banco apareceu. Zangado e grosseiro desfez a fila rapidamente, retirando-se para dentro das portas aos reclamos: “Êta, povinho burro!” 
Então, pareceu-me vivermos contraditoriamente como bárbaros modernos que olham o horizonte com olhos míopes, pregando o amor com total indiferença.

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GRACIAS ANDINAS