segunda-feira, 31 de outubro de 2016

CONTINUA

[CONTINUA]

Um minuto de silêncio eu peço
Aos que morrem da morte do corpo
Violentamente ou pela traição do tempo
Do Destino que reconsidera

Desencarnam
E que o deus de sua preferência,
Na confabulação com os demônios e os anjos
Trate da essência

Mas um minuto de silêncio também eu peço
Aos que morremos todo dia
Do pânico pelo futuro incerto
De ansiedade por um amanhã
Que jamais chega e não virá nunca

Um minutinho diário
A nós que morremos de carência de amor
De asfixia de desamor
Que morremos de carência de mãe e pai
De paixão e sexo
De amigo
De amar

Um minuto por dia
Aos que morremos da ilusão da imortalidade do instante
E transbordamos de emoções perversas
Que perdemos a prudência
De tanto medo irracional
E maldade sem conta
Assim monstros sem alma

Um minutinho apenas
Aos que morremos de querer comida, coito, proteção
Aos que desejamos que o bem nos alcance por milagre
Ou por magia
Que pensamos tanto em nada e tão pouco em tudo
E de tanta mesquinhez morremos
Em camadas, todo dia

Um minuto ao dia, o silêncio
Aos que servilmente nos soterramos nas leviandades
Que enganamos a vida com as ideias sem fundo
Do cotidiano insulso
De vã aparência de coisas

E morremos todos os dias
E nunca morremos

Eu peço um minuto de silêncio
Por todos e por nós

Porque depois do minuto
O silêncio será uma grita ensurdecedora dentro do peito.

[CONTINUA]

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016





                                             FEMME





A forma bela da fêmea me encanta, 

Mas, nesta altura da experiência já não 

recebe integralmente meu aval,

Não inflama incontrolável meu apetite.

Melhor ouvi-la a canção dos lábios, 

Senti-la a sensibilidade dos olhos,

Apreciá-la a perspicácia da alma.

Ai sim, eis uma mulher bonita!

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

OLHOS DA MUSA



A MISERICÓRDIA DO CRIADOR ESTÁ NA CRIAÇÃO
DE TEUS OLHOS CASTANHOS, MISTERIOSOS

CINTILANTES COMO O SOL NA ÁGUA DO MAR LÍMPIDO
E CLAROS COMO O AR

FORTES COMO AS ROCHAS
 E FULGENTES COMO AS ESTRELAS

SEGREDANDO O AMOR
E GUARDANDO O RECATO

PARA DEITAR NA NOITE DA VOLÚPIA
A AMANTE ENSANDECIDA,

LOUCA DE PRAZER E LASCÍVIA

DE BOCA MOLHADA
E VULVA SUMARENTA
UIVA A LOBA SOLITÁRIA
PERDIDA
NA BUSCA DA ESPÉCIE

E ME BEIJAS E ME ENGOLE

EU SUMO, DESAPAREÇO
AMANHECE EM MIM A VERDADE SIMPLES E SÃ

DE TRABALHAR PARA ENGRANDECER AS POSSES
DESDE QUE VOCÊ EXISTA

DE LUTAR CONTRA OS MAUS POR NÓS DOIS

QUE NÃO SOMOS MAIS QUE UM ÚNICO CORAÇÃO

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

A diversidade sexual, a letra fria da lei e o calor da realidade social

A diversidade sexual, a letra fria da lei e o calor da realidade social

Julgava-me habitué de certos lugares da metrópole, cuja época de noites românticas da minha juventude estudantil nos convidava constantemente, a mim e aos amigos, a um bom bate-papo com cerveja, invariavelmente,  e a partidas de xadrez com muita freqüência.
Certa feita, adentrando o bar que nos acolhia pacientemente nessas peculiares e prolongadas sessões, apinhado de um público heterogêneo na ocasião, sentimos que a atmosfera pesava; hesitamos por algum tempo antes de abrir o tabuleiro. Pressentíamos que algo desagradável iria acontecer.
Nunca tínhamos visto o nosso bar com tanta gente diferente. Na realidade nos acostumamos com a solidão do horário e especialmente do lugar. Apenas seis companheiros de sonhos que poetizavam e liam, jogavam xadrez e partiam na alvorada.
Mas naquela noite o pequeno espaço do bar continha muitos casais gays, belos e exuberantes travestis, e também grupos heterossexuais - estes, nítida e propositadamente afastados dos primeiros. Por que pesava o ar? Perguntávamos silentes e a resposta se delineava na possibilidade da intolerância, já que um brutamonte se referia aos homossexuais com desdém, e àqueles pouco se lhe davam que suas espetaculosas e picantes narrações incomodassem os machões. Para encurtar o prefácio ao tema do texto, a briga começou quase no mesmo instante do final da piada desenxabida sobre bichinhas - contada pelo brutamonte; do ciúme do sapatão que supôs um flerte entre sua namorada e um homem do outro grupo, e da bofetada que um traveco aplicou num safadinho que, a pretexto do exíguo corredor do banheiro, bolinou-o escandalosamente.
Saímos em meio a um infernal tumulto. Horas depois rimos muito pelo inusitado dos acontecimentos. Porém, filosofando noutro botequim, ponderamos sobre a delicada condição humana no trânsito dos sentidos e dos desejos ante o imperativo das morais, das convenções, da educação e das leis.
Décadas passaram e eis que surge uma retumbante polêmica jurídico-sociopolítica com inúmeros fatores: o PL122, o Estatuto da Diversidade Sexual, as igrejas, o medo, o desrespeito aos direitos fundamentais do cidadão e da pessoa humana, a discriminação, a urbanidade, as convenções sociais, homens e mulheres, heterossexuais, homossexuais...
Em linhas muito leigamente gerais o projeto de lei nº122 postula a inclusão de atributos de gênero, orientação sexual e identidade de gênero, e ainda idosos e portadores de deficiência na lei contra o preconceito e a discriminação racial 7716/89 que originalmente protegia os indivíduos portadores de atributos de cor, raça, etnia, religião e procedência nacional, com efeito de aplicação do código penal, de relações de trabalho e da vida civil.
Dispensada a pretensão de comentários técnicos, para o que, aliás, não teria conhecimento e habilidade suficientes, fica o registro de que não vejo que haja clareza bastante quanto ao que seria realmente injúria, ofensa ao individuo e aos coletivos dos grupos incluídos, ou seja, numa palavra, o que realmente seria uma atitude de homofobia, passível, então, de penas tão graves. Além de “descobrir um santo para cobrir outro”! Exemplo: impedir, recusar ou proibir o ingresso ou permanência em qualquer ambiente ou estabelecimento público ou privado, aberto ao público. Ora, me parece que rituais de fé e crença que não aceitem a condição homossexual em seu culto terão de aceitá-la, e isso, prima facie feriria direitos e garantias fundamentais dos indivíduos que não concordem.
Já no estatuto da diversidade sexual a coisa fica ainda mais estranha quando pleiteia a supressão dos termos “pai” e “mãe” do registro de nascimento e documentos oficiais; ou quando supõe que uma criança ou adolescente possa vir a ter condição plena de decidir-se pela mudança de sexo. Será?
À vista da amplitude, força e radicalismo dos dispositivos legais (afinal trata-se de lei, regra; de processo civilizatório, reengenharia social, redefinição de normas de união e relacionamento civil, coerção e castigo, valores e liberdades – e, por que não?! - trata-se de mexer com os deuses), os opositores das regras propostas alegam um desmonte da família tal como se formulou culturalmente pelos séculos e séculos, segundo os desígnios de Deus.
Às vezes me dá a impressão de que os que defendem tais diplomas pretendem homossexualizar toda a sociedade numa tacada só; por outro lado ouve-se a grita e a resistência, não raramente truculenta, de heterossexuais.  Tenho sincero receio de que dessa discussão histérica decorra o sério risco do aumento da homofobia e – também, por que não?! – da heterofobia.
Fato, no entanto, é que em 2013, no Brasil, foram celebrados mais de 3mil casamentos homossexuais e que a parada do orgulho LGBT atrai milhares de novos adeptos a cada ano.
No entanto, é fato estrondosamente mais trágico que por ano são assassinados mais de 50 mil brasileiros (a maioria de jovens, negros e pobres) e que o trânsito mata outros mais de 40 mil.
Sem contar que temos sistemas precários de educação e saúde, uma relação fisiologista de poder, uma corrupção endêmica, uma péssima administração pública, uma desigualdade social atroz, uma horrível seleção de futebol (vai como referência de uma copa financeiramente, inclusive, desonrosa) e um sistema eleitoral capenga e duvidoso.
  Ou seja, parece que a acalorada e midiática polêmica sobre homofobia é         necessária, sim, porém, antes de acharmos que estamos democraticamente     tranquilos para fazer uma guerra parlamentar dos sexos, precisaremos sair     do boteco.

domingo, 9 de novembro de 2014

MACHO SEM MACHISMO E FÊMEA SEM FEMINISMO


MACHO SEM MACHISMO E FÊMEA SEM FEMINISMO
Dia destes, minha filha - com quem faço dupla num feminismo positivo e suave (sim, o homem pode ser feminista – aliás, é mais racionalmente feliz quanto mais feminista for!) - deu-me a conhecer a quantas anda por aí essa questão. “Pai, vê só isso!” e abriu alguns vídeos na internet em que se mostrava uma militante brasileira dum movimento leste-europeu em dois momentos: num, debulhando-se em lágrimas de ódio visceral contra os homens e, noutro, confessando ter encontrado o amor de sua vida, um homem; em outro vídeo, em cujo título se apresentava a palavra feminazi um grupo musical formado por mulheres jovens pouco interessadas em make-up ou elegância declarando numa letra sem muita melodia que tinham o direito de uso, por assim dizer, da vagina e do aborto, e outras coisas mais que eu não quis ouvir.
Feminazi, de cara, me deixou em pânico, porque intui tratar-se de uma ilógica sugestão da contração entre feminismo e nazismo. Impossível! Embora num dicionário digital haja a definição de militante do feminismo radical, extremista e misândrico. Na rede consta também que tal termo teria sido empregado pelo apresentador americano de rádio, nos anos de 1990, Rush Limbaugh, se referindo a protestos de mulheres contra um projeto de lei que permitia aos patrões a cobertura parcial de planos de saúde, com redução na proporção dos preços de anticoncepcionais. O fato é que o neologismo parece ter pegado. O último vídeo era um blog de uma moça bonita esclarecendo que feminismo não é o oposto do machismo, que nada tem a ver com humanismo, com misandria, com usar ou não maquiagem, com andar de salto ou dar de quatro.
O curioso é que toda essa discussão parece não existir para muitas garotas que ainda brigam aos sopapos e puxões de cabelos por um menino; jovenzinhas que acham o máximo excitar a rapaziada nos bailes ou postar a anatomia curvilínea em trajes mínimos, recadinhos românticos e selfies com biquinhos no facebook. Não parece interessar tampouco às incontáveis mulheres que desmoronam ante os encontros e desencontros dos casais das novelas. Curioso!
Bem, sem entrar no aspecto histórico das conquistas das mulheres – votar e ser votada, trabalho e profissão, política, educação, arte, enfim, há uma maravilhosa história ainda em curso de lutas e vitórias! – quero apenas dizer rapidamente duas coisas: onde percebo que nós, pessoas dos dois sexos estamos errando na escala evolutiva e, segundo, fazer um apelo a toda gente: que não radicalize. Relaxe um pouco! Nem tanto ao céu e nem tanto ao inferno! OK?!
A coisa pode ter começado com um mito apócrifo de que vasos foram postos no sol, um rachou e outro estufou, e desde então o mundo é o mundo com macho e fêmea, fazendo-se pesado à mulher pela longeva organização social patriarcal, mas também pela teimosia de machos mandões e fêmeas odientas que não compreendem que nada seriam um sem o outro, e levam então a possibilidade de um diálogo para o campo feroz das hostilidades em desespero de causa. Eis nosso erro: sermos machos sem deixarmos de ser machistas ou fêmeas sem deixarmos de ser feministas, buscando num sufixo, a alternativa à simplicidade de nossa existência.
A segunda e rápida coisa a registrar é que ao invés de lutarmos por igualdades inconcebíveis, definitivamente achemos o que há de interesse comum, direita e indiretamente a todos: a capacidade intelectual e construtiva dos indivíduos e da sociedade, o absoluto acesso aos direitos e deveres (trabalhistas, da economia doméstica, da concepção e educação dos filhos, etc.). Finalmente, que não existiríamos um sem o outro. A humanidade não existira senão pela infinita misericórdia de Deus que criou estes seres à sua imagem e semelhança – “homem e mulher os criou”.
Proponho, portanto, que nós homens e mulheres, respeitemo-nos como seres morais, antes de nossas necessidades, naturais ou culturais, de sexo e sensação de poder.

domingo, 2 de novembro de 2014

ELEIÇÃO DA REPÚBLICA

ELEIÇÃO DA REPÚBLICA

Ele estava em casa quando uma comissão militar o chamou para liderar a revolta, alertando que iam prendê-lo e que seu rival no amor de uma bela dona tornar-se-ia Presidente do Conselho de Ministros em breve. Então vestiu a farda, atravessou a pé a praça até um quartel do outro lado, onde lhe deram um cavalo. Montou, tirou o chapéu e proclamou a república. Depois desceu do cavalo e foi para casa. No estertor do Império, defronte ao General da Guarda a quem o principal assessor da monarquia pedia guarida invocando a coragem do bravo militar, o conselheiro ouviu daquele oficial que no Paraguai havia inimigos enquanto ali todos eram brasileiros.
Assim teria sido a Proclamação da República, dia 15 de Novembro de 1889. As personagens são o Marechal Deodoro da Fonseca, o General Floriano Peixoto e o então chefe do Conselho Ministerial, Visconde de Ouro Preto.
No avanço de 125 anos da República Federativa do Brasil chegamos ao acirrado pleito eleitoral de 2014. Porém, parece um momento anti-republicano gerado pelo fígado de alguns grupos que, em alguma medida traz um quêzinho das expectativas de antanho, quando república era a necessária maneira de conduzir a vida política e os interesses socioeconômicos naquele fim de século XIX. Hoje parece que querem o contrário! Na era da globalização, dos mercados financeiros, das redes sociais na internet vê-se que os fazendeiros ressentidos pelo prejuízo da revogação da mão de obra escrava foram substituídos pelo capital sedento de lucro; a igreja cristã, católica, que se retirara magoada com o Estado, hoje matizada em muitas denominações, deseja mais força nos jogos de poder; os burgueses florescentes hoje são a classe média em busca do primeiro milhão; os crioulos e liberais que desejaram o sufrágio universal em lugar do voto censitário foram trocados por brancos padrão norte-americano-europeu que não confiam no voto dos mestiços e dos pobres; em lugar das mulheres belas e silentes, novas mulheres, belas certamente, filmam graves xingamentos públicos.

A diferença é que D. Pedro II (igualmente mal assessorado) gozava de maior respeitabilidade pessoal que os nomes de hoje. Tenho esperança de que isso não faça a diferença, pois se lá a República era urgente, aqui a Monarquia é inconcebível.

GRACIAS ANDINAS