segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

O GRANDE INQUISIDOR - DE DOSTOIÉVSKI (INQUISITION)

O filme de cinco ou seis capítulos compilados no YouTube, com aproximados 50 minutos totais, é impactante. Ainda mais se o espectador assistir ao documentário visual sobre instrumentos de tortura do tribunal da inquisição - suplemento do filme.
Impactante a ponto de fazer titubear a alma entre o divino e sagrado, e a mera perversão humana na aplicação dos preceitos de fé cristã.
Impactante a ponto mesmo de vir a endossar eventuais apostasias.
A idéia central é: Por que a inquisição?
No contexto desse santo ofício da igreja católica, a todo vapor na Europa, que justificativa poderia ser dada a Jesus Cristo, se sua segunda vinda acontecesse exatamente naquele momento histórico? Como fundamentar tamanha intolerância e crueldade em Seu nome - o Príncipe da Paz e personificação do amor? De que maneira racionalizar a contradição entre a humildade do Filho de Deus e a opulência intolerante, o poder e a brutalidade da santa igreja?
Assim, dramaturgicamente em diálogos (e monólogos) profundos sem efeitos cinematográficos mirabolantes – oportunidade ímpar de demonstração de talentos -, colocados tête-à-tête Nosso Senhor e um cardeal da Espanha de 1680, responsável pelos julgamentos e autos-de-fé, as revelações são confessadas porque não há relativização, não cabem justificativas.
Não acontece qualquer escaramuça natural de um debate que pudesse ensejar meias-palavras e contorcionismos retóricos. Jesus não fala nem reage. A eloqüência de seu silêncio o faz por Ele.
As verdades do cardeal: o cristianismo de Cristo não serve para aplacar o sofrimento dos homens; não cumpre a promessa de liberdade porque o homem não pode ou não quer ser livre; não atende às necessidades básicas e materiais da humanidade: pão e conforto nesta vida, e não na outra.
O cardeal vai adiante: Jesus errou em negar as três propostas de Satanás na tentação do deserto, quais sejam os milagres, o mistério e o poder.
Porém a santa igreja teria compreendido melhor do que Cristo a grandiosidade das tentações, e, portanto teria atraído a si o mistério, sob a égide do cristianismo, dispensando qualquer maior participação de seu fundador. Serviam na realidade ao Diabo, e a volta de Jesus seria desastrosa para a existência da instituição.
Ao final, após o beijo purgatório de Cristo, o Cardeal, dominado pelo remorso, coloca-se em lugar do condenado e caminha para a fogueira santa. 
Meu ponto de vista: um pecado do filme (intencional ou por enfoque diverso) foi colocar a santa inquisição como sendo a própria Igreja, ou como seu emblema absoluto, não tendo ao menos insinuado que não é.
Não, a inquisição não é ícone da igreja, no passado, como, p.ex. a Opus Deis não poderia ser emblema da Igreja, hoje [para quem, desavisado, possa fazer confusão no Código Da Vinci].
Correntes a parte, a igreja Cristã - e a católica, como a primeira e maior instituição cristã de amplitude mundial - era e é formada por inúmeras ordens, correntes, tendências e denominações, embora a hierarquização temporal segundo a qual eventos catastróficos como o tribunal da inquisição foram permitidos.
Foi, sim, um dos capítulos mais tristes e medonhos da história da humanidade perpetrados por grupos sádicos e pervertidos, durante mais de seis séculos, e para o que não há perdão na Terra que possa aliviar seu crime.
Mas não foi a Igreja que a instrumentalizou, muito menos teve o beneplácito de Deus, e nem mesmo foi unanimidade entre os religiosos da época - vide “O Nome da Rosa”, em que beneditinos, a comissão papal e os capuchinhos, se vêm, a contragosto (sobretudo os últimos) candidatos a júri de perfumaria, para a condenação de supostos hereges.
Foi instrumento usado na igreja em face de seu poderio político, a serviço de homens maus e diabólicos.
Contudo, a história não diminui o filme, ao contrário, a simbiose entre conteúdo e forma deu conta da mensagem, perfeitamente.

Um comentário:

  1. A " RELIGIÃO e a melhor couraça que o Homem pode usar, mas o pior disfarce". Byron. assim como no passado o cristo e crucificado a todo momento no presente.

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GRACIAS ANDINAS