segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Defesa do cronista por uma crônica criticada

A crônica unia futebol – mais especificamente um jogador muitíssimo badalado -, a tragédia do Rio de Janeiro e uma atriz global. Registro: atriz da rede Globo de televisão. (Convém dizer, pois no futuro próximo - a julgar pela queda de audiência e surgimento de concorrentes à altura - do que não advém qualquer mérito -, as gerações vindouras não compreendam de imediato o que significa a expressão “atriz global”).
O foco não era claramente nenhum deles, mas o pretexto – ou pano de fundo - era a tragédia; o jogador entrou na história como aquele que, segundo a massa, deveria doar um salário para as vítimas; e a atriz? Bem, ela entrou como um argumento de autoridade da plebe, uma porta-voz do povo a robustecer a tese a qual o escritor atacou veementemente no seu texto.
A real intenção do cronista: demolir a opinião popular de que quem vem de comer capim, nunca chegará a jardineiro.
O cronista da ESPN disse que a opinião era um recalque, pois o povo requerer ao jogador uma paga como doação aos flagelados, e a atriz dizer que profissionais daquela categoria não tinham classe ou educação (ou algo assim), não tinham fundamento na realidade, senão apenas no repúdio ao sucesso dos indivíduos de classes menos abastadas que atingiram os píncaros da fortuna e da fama.
O resultado do texto não foi dos melhores, por isso um amigo fez uma bela crítica do efeito, da inteligibilidade, do foco, enfim do cronista profissional.
Disse ao amigo, em defesa do cronista, que não é fácil sê-lo.
O camarada tem o dever de produzir um texto pré-diagramado, necessariamente empolgante, num prazo curtíssimo.
Convulsionando entre tais deveres e as morais que pairam dentro e fora das salas dos editores, o cronista concilia seus próprios pensamentos e opera muitas vezes um milagre: dá à luz uma forma diferente de ver o que quase todo mundo vê igual.
O efeito nem sempre é interessante a todos. Se não for interessante a ninguém, aí o cabra corre o risco de perder o emprego. Mas, se viver é um risco...
O texto assim produzido ocupará seu lugar no anverso de uma propaganda paga em algum magazine ou espaço-tempo de outro meio de comunicação.
Na verdade o cronista estava farto do que vinha exalando dos poros midiáticos nas últimas semanas, com o pretexto de referir-se à tragédia do Rio: opiniões, “achismos” e conversinhas balofas. Ninguém se atrevia a falar sobre o descalabro das políticas públicas de assentamento urbano; da desigualdade da distribuição fundiária e da concentração de terras em poucas mãos; do prejuízo da falta de reforma agrária, etc.
Ao contrário, o cronista via desconversas custosas no anverso de propagandas pagas antes e depois da sua página.
Estou com ele: a tragédia do Rio de Janeiro é nossa.

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GRACIAS ANDINAS